Catequistas de Conquista
segunda-feira, 19 de maio de 2014
Crise do compromisso comunitário e as tentações que os catequistas precisam evitar
Por Dom Vilson Dias de Oliveira, DC
(Cap. II da Exortação Apostólica “Evangellii Gaudium”)
CRISE DO COMPROMISSO COMUNITÁRIO
Para se entender “a crise do compromisso comunitário” é preciso analisar alguns aspectos de nosso tempo. Os estudiosos têm usado a expressão “mudança de época” para nos alertar que é mais profunda do que simplesmente algumas transformações culturais; a mudança de época tange as estruturas sociais, os critérios de julgamento, os valores que permeiam nossas relações, as formas do pensamento, a maneira como compreendemos o mundo, a vida, a economia, a sociedade. É uma mudança de paradigma, as respostas que tínhamos para as questões que nos intrigavam não servem mais. Não se admite que haja uma única resposta para os problemas, serão sempre “respostas”, no plural, que variam conforme o ponto de vista do autor, de suas escolhas ideológicas, seus interesses. Cada um terá a “sua” verdade, a “sua” interpretação dos fatos, o “seu” pensamento sobre os quais ninguém pode confrontar, descredenciar. É direito adquirido. “Eu penso assim e ponto!”O papa Bento XVI já havia nos advertido a respeito do “relativismo” que tomou conta de nossas escolas, famílias, tvs, internet, comunidades…. “cada um escolhe o que lhe convêm, a resposta que mais lhe agrada…”. É a impotência da objetividade diante da avalanche do subjetivismo e da hiper valorização do indivíduo. Se cada pessoa faz suas escolhas a partir de seus interesses, do “que lhe agrada”, então é a derrocada das relações interpessoais, o “outro” só é necessário na medida em que me serve, me ajuda, me favorece. Qualquer tentativa de criar relações só funcionará na medida em que me “agradarem” ou me servirem. É uma faceta da crise da vida comunitária.
Diz o Papa Francisco na Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”:
“A humanidade vive, neste momento, uma viragem histórica, que podemos constatar nos progressos que se verificam em vários campos. São louváveis os sucessos que contribuem para o bem-estar das pessoas, por exemplo, no âmbito da saúde, da educação e da comunicação. Todavia não podemos esquecer que a maior parte dos homens e mulheres do nosso tempo vive o seu dia a dia precariamente, com funestas consequências. Aumentam algumas doenças. O medo e o desespero apoderam-se do coração de inúmeras pessoas, mesmo nos chamados países ricos. A alegria de viver frequentemente se desvanece; crescem a falta de respeito e a violência, a desigualdade social torna-se cada vez mais patente. É preciso lutar para viver, e muitas vezes viver com pouca dignidade. Esta mudança de época foi causada pelos enormes saltos qualitativos, quantitativos, velozes e acumulados que se verificam no progresso científico, nas inovações tecnológicas e nas suas rápidas aplicações em diversos âmbitos da natureza e da vida. Estamos na era do conhecimento e da informação, fonte de novas formas dum poder muitas vezes anônimo.” (EG 52)
São várias as dimensões da crise comunitária, vamos olhar pelo menos três delas: a dimensão econômica, social e religiosa. Elas se implicam umas nas outras, somente a título de estudo e que as separamos:
1. Dimensão econômica: as relações humanas estão marcadamente condicionadas pelas relações de poder econômico. Os interesse financeiros se sobrepõem aos direitos de viver, de ir e vir, de estudar, de cuidar da saúde… Subordinada ao dinheiro a vida vira mercadoria. Se uma vida não gera lucros, torna-se dispensável, descartável. Neste sentido se fala de “massas sobrantes”. É o “horror econômico”! Com isto aumentam-se as divisões sociais, a miséria, os conflitos urbanos e a violência.
“Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras. Além disso, a dívida e os respectivos juros afastam os países das possibilidades viáveis da sua economia, e os cidadãos do seu real poder de compra. A tudo isto vem juntar-se uma corrupção ramificada e uma evasão fiscal egoísta, que assumiram dimensões mundiais. A ambição do poder e do ter não conhece limites. Neste sistema que tende a fagocitar tudo para aumentar os benefícios, qualquer realidade que seja frágil, como o meio ambiente, fica indefesa face aos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta.” (EG 56)
PARA PENSAR:
Como catequistas,qual nossa opinião a respeito dessa economia que exclui e gera competições desumanas? Não é comum as pessoas dizerem: “amigos, amigos; negócios à parte”? O que Jesus diria disso? É possível viver num mundo do “salve-se quem puder”? O quanto tudo isto afeta nossa vida de comunidade?
O Papa Francisco, em sua exortação apostólica Evangelii Gaudium, sugere que digamos: não à essa economia de exclusão! Não à idolatria do dinheiro! Não à um dinheiro que governa em vez de servir!
2. Dimensão social: com a globalização da economia, também globalizou-se a pobreza e a miséria. As sociedades se estratificaram ainda mais. Há cada vez menos ricos com mais dinheiro e mais pobres com menos recursos. Cria-se o fosso social. Esta desigualdade de oportunidades revela-se no mundo do trabalho, de estudo, de condições de vida. Isto gera insegurança e violência. Gasta-se mais tempo indo e vindo do trabalho e menos na convivência familiar, na educação dos filhos. O subemprego leva a ter “que se virar nos trinta” para conseguir sobreviver. Compreende-se aqui o aliciamento do mundo das drogas que introduzem os jovens no mundo do crime com a esperança de uma vida melhor, o tráfico humano, a prostituição juvenil em troca de favores, o trabalho escravo e infantil. Os conflitos sociais aumentam à medida em que cresce a desigualdade de oportunidades. A ideologia “do ter para ser feliz” seduz também os empobrecidos, que inventam formas de se projetar: rollezinhos, baile funk…
Também aqui o Papa Francisco sugere: não à desigualdade social que gera violência!
3. Dimensão religiosa: um mundo marcadamente desigual, violento e excludente favorece o aparecimento de “vários discursos religiosos”, com uma infinidade de ofertas e busca de fieis. Há um mercado religioso, no qual nos tornamos “uma igreja” em meio a centenas. Neste mercado oferece-se cura, milagres, salvação, enriquecimento, prosperidade…
Diz o papa nos números 63 e 64 da “Evangelii Gaudium”:
(63) “A fé católica de muitos povos encontra-se hoje perante o desafio da proliferação de novos movimentos religiosos, alguns tendentes ao fundamentalismo e outros que parecem propor uma espiritualidade sem Deus. Isto, por um lado, é o resultado duma reação humana contra a sociedade materialista, consumista e individualista e, por outro, um aproveitamento das carências da população que vive nas periferias e zonas pobres, sobrevive no meio de grandes preocupações humanas e procura soluções imediatas para as suas necessidades. Estes movimentos religiosos, que se caracterizam pela sua penetração sutil, vêm colmar, dentro do individualismo reinante, um vazio deixado pelo racionalismo secularista. Além disso, é necessário reconhecer que, se uma parte do nosso povo batizado não sente a sua pertença à Igreja, isso deve-se também à existência de estruturas com clima pouco acolhedor nalgumas das nossas paróquias e comunidades, ou à atitude burocrática com que se dá resposta aos problemas, simples ou complexos, da vida dos nossos povos. Em muitas partes, predomina o aspecto administrativo sobre o pastoral, bem como uma sacramentalização sem outras formas de evangelização.
“O processo de secularização tende a reduzir a fé e a Igreja ao âmbito privado e íntimo. Além disso, com a negação de toda a transcendência, produziu-se uma crescente e deformação ética, um enfraquecimento do sentido do pecado pessoal e social e um aumento progressivo do relativismo; e tudo isso provoca uma desorientação generalizada, especialmente na fase tão vulnerável às mudanças da adolescência e juventude” (EG 64).
É claro que é preciso ressaltar o quanto, apesar de tantas críticas e ataques,a Igreja Católica é ainda uma instituição de muita credibilidade, confiável pela maioria da opinião pública sobretudo no que diz respeito à solidariedade e preocupação com os miseráveis, como medianeira em soluções de conflitos e defesa dos direitos humanos, como aquela que favorece o conhecimento através de universidade e escolas católicas.
PARA PENSAR:
Os nossos catequistas percebem essa realidade desafiadora para a vida comunitária? Quepoderíamos fazer para fortalecer nosso compromisso comunitário diante dessas forças contrárias?
AS TENTAÇÕES QUE OS CATEQUISTAS PRECISAM ADQUIRIR:
São muitas qualidades que uma pessoa tem de ter para ser catequista. A seguir elenco algumas dessas características:
Pessoa que fez uma experiência de Deus, encontrou e continua encontrando-o nos irmãos e nos acontecimentos da História
Pessoa de fé
Pessoa que busca um equilíbrio psíquico-espiritual
Pessoa aberta ao novo
Pessoa solidária
Pessoa que busca crescer sempre, num processo contínuo de evolução
Pessoa estudiosa e praticante da Palavra de Deus
Pessoa que tem esperança
Pessoa que gosta de gente
Pessoa que respeita a cultura popular
Pessoa alegre, disponível
Pessoa que procura ama e vive para amar gratuitamente
Pessoa que se sente parte do Corpo de Cristo
Pessoa de igreja
Pessoa que gosta de servir
Pessoa que perdoa
Pessoahonesta
Mistagogo
PARA PENSAR:
Diante de uma visão tão idealizada, quais são astentações dos catequistas hoje? E como resisti-las e superá-las?
II – AS TENTAÇÕES QUE OS CATEQUISTAS PRECISAM EVITAR:
São muitas as tentações dos catequistas hoje. A seguir vou apresentar 7 tentações, não porque sejam as mais importantes, mas porque para um processo de superação deve-se começar aos poucos. Se dermos conta de 7, depois veremos outras 7 e assim por diante.
Individualismo da fé.
A preocupação com a felicidade pessoal chegou a tal ponto que as pessoas buscam atingir espaços de gratificação, de relaxamento, de conforto, de autonomia, de tranquilidade, de alívio… Dessa forma a vida espiritual boa é aquela que conduz o fiel à essa experiência gratificante. Busca-se uma religião que satisfaça essas necessidades imediatamente, que cumpra esse papel gratificador, que não seja exigente, nem comprometedora, aonde se possa receber “boas energias”, “bons fluidos”… uma religião que se torna um apêndice da vida e não compromete a pessoa, nem a leva a um encontro definitivo e profundo com Deus, com os irmãos. Uma religião light. Aqui há um declínio do fervor, uma miscelânea de doutrinas e ideias teológicas, uma confusão de identidades. Apregoa-se o crer em Deus, sem Igreja.
“A cultura midiática e alguns ambientes intelectuais transmitem às vezes, uma acentuada desconfiança quanto à mensagem da Igreja, e um certo desencanto. Em consequência disso, embora rezando, muitos agentes de pastorais desenvolvem uma espécie de complexo dei inferioridade que os leva a relativizar ou esconder a sua identidade cristã e as suas convicções. Gera-se então um círculo vicioso, porque assim não se sentem felizes com o que são nem com o que fazem, não se sentem identificados com a missão evangelizadora, e isto debilita a entrega. Acabam assim por sufocar a alegria da missão numa espécie de obsessão por serem como todos os outros e terem o que possuem os demais. Deste modo, a tarefa da evangelização torna-se forçada e dedicasse-lhe pouco esforço e um tempo muito limitado.” (EG 79)
O universo das comunicações, com seus tantos recursos midiáticos, os ambientes intelectuais (universidades, escolas…) cooperam para aumentar uma certa desconfiança com relação ao papel da igreja, de seus representantes. Muitas vezes há um esforço para descredenciar o discurso religioso e eclesial. Em consequência disto muitos catequistas, quando enfrentam esses ambientes, sentem-se inferiorizados, envergonhados e não se encorajam para defender sua identidade. Às vezes porque não se sentem preparados, outras porque ficam confusos em meio a tantas informações. Passam assim a esconder sua identidade cristã-católica e convicções.
Há ainda o risco de um afastamento cada vez maior entre fé e vida, como se uma realidade não implicasse na outra. O “ser catequista” não interfere na vida pessoal, não há ponto de encontro entre uma coisa e outra, assim é possível encontrarmos catequistas que não se importam com os pobres, que passam por sobre os colegas para galgar vantagens, que se deixam seduzir pelas novelas, que não rezam, que não participam das missas na comunidade, que se agarram a seguranças econômicas ou a espaços de poder e glória humana, que buscam mais a si do que a Deus. É preciso resistir a essa tentação! Não deixemos que nos roubem o entusiasmo missionário! Ou que nos separem de Cristo!
Não ao desânimo egoísta
A segunda tentação que precisamos estar atentos é o desânimo que brota do egoísmo. Hoje em dia é muito difícil encontrar pessoas para trabalharem na igreja, ninguém tem tempo! Na verdade não se quer dispor do tempo livre para realizar tarefas apostólicas, ser catequista. Há uma consciência muito grande do direito ao descanso, ao lazer, ao cuidar de si que beira ao egoísmo. As pessoas gastam a maior parte do seu tempo obsessivamente atrás de si, por isto resistem a tudo o que ameace esses espaços “sagrados” de autonomia e centralização em si, é como se a tarefa da catequese ou da evangelização, os trabalhos pastorais roubassem esse precioso tempo! Não veem essa doação como uma resposta alegre ao amor de Deus, que nos plenifica e fecunda. Este fechamento leva ao desânimo paralisador!
A dificuldade está na falta de uma espiritualidade que impregne a ação e a torne desejável. O cansaço não é feliz, mas tenso, desagradável, irritante. Muitas vezes a catequese é vista como obrigação, sem motivação. São várias as causas desse mal estar: idealização excessiva, irrealizável; imediatismo que desconsidera o processo histórico numa pressa em obter resultados; vaidades, desorganização, falta de planejamento, apego ao passado, falta de sensibilidade pastoral, interesses pessoais acima dos interesses comunitários, intolerância com os erros dos irmãos, excesso de ideias e burocracias que inoperantes…
“Assim se gera a maior ameaça, que «é o pragmatismo cinzento da vida quotidiana da Igreja, no qual aparentemente tudo procede dentro da normalidade, mas na realidade a fé vai-se deteriorando e degenerando na mesquinhez». Desenvolve-se a psicologia do túmulo, que pouco a pouco transforma os cristãos em múmias de museu. Desiludidos com a realidade, com a Igreja ou consigo mesmos, vivem constantemente tentados a apegar-se a uma tristeza melosa, sem esperança, que se apodera do coração como «o mais precioso elixir do demónio». Chamados para iluminar e comunicar vida, acabam por se deixar cativar por coisas que só geram escuridão e cansaço interior e corroem o dinamismo apostólico. Por tudo isto, permite que insista: Não deixemos que nos roubem a alegria da evangelização!” (EG 83).
É preciso dizer não ao pessimismo estéril! Resistir a esta tentação!
Não ao pessimismo estéril
A terceira tentação para os catequistas é perder a força e o ânimo diante das mazelas operantes no mundo e na igreja. Coisas ruins acontecem. Muitas vezes fracassamos. Contudo isto não deve tirar nossa esperança. Aquele que crê é capaz de ver o trigo no meio do joio, a água que se transforma em vinho, a luz na escuridão. Há os profetas da desgraça, que apregoam o fim da fé, da igreja, a morte de Deus; não podemos nos deixar levar pelas suas palavras. É preciso lembrar o que Jesus diz a S. Paulo “Basta-te a minha graça; pois é na fraqueza que a força se realiza plenamente” (2Cor 12,9). Não se trata de tapar o sol com a peneira, as dificuldades existentes devem ser enfrentadas. O mal existe, mas nossa esperança está em Deus, que não nos abandona e nos encoraja para a luta!
É preciso vencer o pessimismo! Não deixemos que nos roubem a esperança!
“Uma das tentações mais sérias que sufoca o fervor e a ousadia é a sensação de derrota que nos transforma em pessimistas lamurientos e desencantados com cara de vinagre. Ninguém pode empreender uma luta, se de antemão não está plenamente confiado no triunfo. Quem começa sem confiança, perdeu de antemão metade da batalha e enterra os seus talentos. Embora com a dolorosa consciência das próprias fraquezas, há que seguir em frente, sem se dar por vencido, e recordar o que disse o Senhor a São Paulo: «Basta-te a minha graça, porque a força manifesta-se na fraqueza» (2 Cor 12, 9). O triunfo cristão é sempre uma cruz, mas cruz que é, simultaneamente, estandarte de vitória, que se empunha com ternura batalhadora contra as investidas do mal. O mau espírito da derrota é irmão da tentação de separar prematuramente o trigo do joio, resultado de uma desconfiança ansiosa e egocêntrica” (EG 85).
Não ao isolamento
Em tempos de desconfiança, violência e individualismo, cada vez mais as pessoas se fecham. A falta de tempo, a intolerância, levam as pessoas a acreditarem no “cada um por si e Deus por todos!”. Com istovalores que são essenciais para os seguidores de Jesus, como solidariedade, amizade, compaixão, entram em desuso. O catequista deve esforçar-se para combater esse isolamento, descobrindo a mística que nasce do viver juntos, da comunidade, do mútuo apoio em horas difíceis, da experiência de fraternidade, de ser povo de Deus, peregrino….assim o catequista é aquele que faz o caminho com os outros, que vai junto com os irmãos, numa alegre e difícil travessia da vida, fazendo história comunitária.
O isolamento quase sempre desemboca num individualismo doentio, deprimente e num uso da religião como mercadoria, remédio para as tristezas pessoais. Em nosso tempo nem sempre busca-se a religião por causa de Deus, muitas vezes é por causa egoísta e humana, simplesmente, quer-se um Deus que sirva e realize as vontades individuais.
Jesus ensina os catequistas a criar e manter relacionamentos novos, a enxergar em cada irmão um próximo a ser servido e amado.
“Nisto está a verdadeira cura: de fato, o modo de nos relacionarmos com os outros que, em vez de nos adoecer, nos cura é uma fraternidade mística, contemplativa, que sabe ver a grandeza sagrada do próximo, que sabe descobrir Deus em cada ser humano, que sabe tolerar as moléstias da convivência agarrando-se ao amor de Deus, que sabe abrir o coração ao amor divino para procurar a felicidade dos outros como a procura o seu Pai bom. Precisamente nesta época, inclusive onde são um «pequenino rebanho» (Lc12, 32), os discípulos do Senhor são chamados a viver como comunidade que seja sal da terra e luz do mundo (cf. Mt5, 13-16). São chamados a testemunhar, de forma sempre nova, uma pertença evangelizadora. Não deixemos que nos roubem a comunidade!” (EG 92).
Os catequistas devem resistir ao isolamento! Dizer sim à vida em comunidade, às relações fraternas.
Não ao mundanismo espiritual
Talvez essa seja, das tentações, a mais difícil de lidar, porque ela vem “maquiada” com cara de boa, é “lobo vestido de cordeiro!”. Podemos vê-la quandoum grupo de catequistas se põe de guarda fiel da doutrina da igreja, dos ensinamentos de Jesus e assim julga e condena os demais. Do alto de suas “verdades”ele analisa, classifica, aprova, exclui, condena os demais. Está sempre de vigilância, apegado a certos tradicionalismos ou seguranças a um estilo antigo de igreja, vive querendo repetir o passado, não percebe, nem aceita a ação inovadora do Espírito. Com medo do novo ele impõe os velhos esquemas. Cheio de ideias, perito em dar ordem aos demais, de dizer como deveriam ser as coisas, não se mexe, nem mexe uma “palha com a ponta de seus dedos!” Muitas vezes é rigorista, mostra-se zeloso com as coisas da Igreja, envaidece-se com suas liturgias, com os rituais, com a sabedoria da doutrina, mas esquecem-se do Evangelho! No fundo é uma busca de glória, de reconhecimento quer de si mesmo ou da Igreja, em prejuízo da mensagem de Jesus, do Evangelho! É bom lembrar: a igreja é servidora do Evangelho e não o contrário!
“Quem caiu neste mundanismo olha de cima e de longe, rejeita a profecia dos irmãos, desqualifica quem o questiona, faz ressaltar constantemente os erros alheios e vive obcecado pela aparência. Circunscreveu os pontos de referência do coração ao horizonte fechado da sua imanência e dos seus interesses e, consequentemente, não aprende com os seus pecados nem está verdadeiramente aberto ao perdão. É uma tremenda corrupção, com aparências de bem. Devemos evitá-lo, pondo a Igreja em movimento de saída de si mesma, de missão centrada em Jesus Cristo, de entrega aos pobres. Deus nos livre de uma Igreja mundana sob vestes espirituais ou pastorais! Este mundanismo asfixiante cura-se saboreando o ar puro do Espírito Santo, que nos liberta de estarmos centrados em nós mesmos, escondidos numa aparência religiosa vazia de Deus. Não deixemos que nos roubem o Evangelho!” (EG 97).
Não à guerra entre nós
Há no mundo muitos conflitos, países guerreando entre si, agora mesmo estamos acompanhando a questão da Ucrânia, Rússia e Estados Unidos. A guerra é um mal, é a incompetência humana, a falência do diálogo, do perdão.
“O mundo está dilacerado pelas guerras e a violência, ou ferido por um generalizado individualismo que divide os seres humanos e põe-nos uns contra os outros visando o próprio bem-estar. Em vários países, ressurgem conflitos e antigas divisões que se pensavam em parte superados. Aos cristãos de todas as comunidades do mundo, quero pedir-lhes de modo especial um testemunho de comunhão fraterna, que se torne fascinante e resplandecente. Que todos possam admirar como vos preocupais uns pelos outros, como mutuamente vos encorajais animais e ajudais: «Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 35). Foi o que Jesus, com uma intensa oração, Jesus pediu ao Pai: «Que todos sejam um só (…) em nós [para que] o mundo creia» (Jo 17, 21). Cuidado com a tentação da inveja! Estamos no mesmo barco e vamos para o mesmo porto! Peçamos a graça de nos alegrarmos com os frutos alheios, que são de todos” (EG 99)
Infelizmente,às vezes, esse espírito de contenda e disputa penetra a vida das comunidades cristãs. Não é raro vermos catequistas disputando atenção, competindo pelo reconhecimento de seus trabalhos, movidas pela inveja, ciúme, vaidades. Neste contexto é importante que tomemos consciência do que significa participar da Igreja, aonde todos os membros são importantes, cada um com seus dons e qualidades, que não anulam, nem ofuscam os dos demais. O mandamento do amor deve permear nossas relações e findar as guerras. Somente quem compreendeu o que significa “vede como se amam!” é que é capaz de lançar mão do perdão, do resgate do diálogo, da paciência com os erros e quedas dos outros, da libertação de se ter novas chances sendo perdoado! Rezar por aqueles que nos ofenderam.
Resistamos às guerras e não deixemos que nos roubem o amor fraterno!
Não ao clericalismo
O Concílio Vaticano II nos ajudou a compreender a Igreja como Povo de Deus e a resgatar o papel dos leigos na comunidade. Contudo, por falta de formação, por busca de poder, muitas vezes alguns catequistas exercem uma liderança autoritária. Por serem competentes, muitas vezes com qualidades que se sobressaem, ocupam lugares de relevância nas comunidades e, infelizmente, exercem o serviço como poder, querem que suas ideias prevaleçam, que as coisas aconteçam segundo sua determinação. Normalmente são pessoas competitivas, vaidosas e dominadoras. É preciso voltar a Jesus e reparar na sua maneira de servir, lavando os pés. A autoridade não brota da força da dominação, mas do exemplo daqueles que amam. Quando isto não é percebido muitos se afastam da comunidade, passa-se a espelhar não o rosto de Jesus, mas do fulano ou fulana que mandam na igreja. É uma reprodução ruim dos esquemas de poder vigente no mundo e na história. A comunidade servidora não está fechada nela mesma, está disposta a sair de si e servir e transformar a sociedade.
“A configuração do sacerdote com Cristo Cabeça – isto é, como fonte principal da graça – não comporta uma exaltação que o coloque por cima dos demais. Na Igreja, as funções «não dão justificação à superioridade de uns sobre os outros». Com efeito, uma mulher, Maria, é mais importante do que os Bispos. Mesmo quando a função do sacerdócio ministerial é considerada «hierárquica», há que ter bem presente que «se ordena integralmente à santidade dos membros do corpo místico de Cristo». A sua pedra de fecho e o seu fulcro não são o poder entendido como domínio, mas a potestade de administrar o sacramento da Eucaristia; daqui deriva a sua autoridade, que é sempre um serviço ao povo. Aqui está um grande desafio para os Pastores e para os teólogos, que poderiam ajudar a reconhecer melhor o que isto implica no que se refere ao possível lugar das mulheres onde se tomam decisões importantes, nos diferentes âmbitos da Igreja” (EG 104).
No espaço comunitário e catequético os jovens, as crianças, as mulheres e os anciãos deveriam reconhecer-se, tornando-o como espaço seu de convivência, de experiência de amor desinteressado, gratuito. Neste sentido é preciso abolir qualquer tipo de ditadura e promover a inserção, a acolhida generosa de todos! Digamos não ao poder centralizador e autoritário! Busquemos a formação de lideranças democráticas, capazes de diálogo e serviço.
O Papa Francisco traz uma palavra aos jovens e sua importância na comunidade cristã, recordando a importância do seu papel e do seu engajamento nas comunidades e paróquias e na busca de caminhos novos para os mesmos:
“A pastoral juvenil, tal como estávamos habituados a desenvolvê-la, sofreu o impacto das
mudanças sociais. Nas estruturas ordinárias, os jovens habitualmente não encontram respostas para as suas preocupações, necessidades, problemas e feridas. A nós, adultos, custa-nos ouvi-los com paciência, compreender as suas preocupações ou as suas reivindicações, e aprender a falar-lhes na linguagem que eles entendem. Pela mesma razão,
as propostas educacionais não produzem os frutos esperados. A proliferação e o crescimento de associações e movimentos predominantemente juvenis podem ser interpretados como uma ação do Espírito que abre caminhos novos em sintonia com as suas expectativas e a busca de espiritualidade profunda e dum sentido mais concreto de pertença. Todavia é necessário tornar mais estável a participação destas agregações no âmbito da pastoral de conjunto da Igreja” (EG 105).
Finalmente recorda a escassez das vocações sacerdotais e religiosas em nossa igreja, recorda-nos que é preciso um grande ardor apostólico para suscitar o chamado de Cristo à muitos jovens presentes em nossas comunidades, bem como nossas orações ao Senhor da messe que envie trabalhadores à sua messe:
“Em muitos lugares, há escassez de vocações ao sacerdócio e à vida consagrada. Frequentemente isso se fica a dever à falta de ardor apostólico contagioso nas comunidades, pelo que estas não entusiasmam nem fascinam. Onde há vida, fervor, paixão de levar Cristo aos outros, surgem vocações genuínas. Mesmo em paróquias onde os sacerdotes não são muito disponíveis nem alegres, é a vida fraterna e fervorosa da comunidade que desperta o desejo de se consagrar inteiramente a Deus e à evangelização, especialmente se essa comunidade vivente reza insistentemente pelas vocações e tem a coragem de propor aos seus jovens um caminho de especial consagração. Por outro lado, apesar da escassez vocacional, hoje temos noção mais clara da necessidade de melhor seleção dos candidatos ao sacerdócio. Não se podem encher os seminários com qualquer tipo de motivações, e menos ainda se estas estão relacionadas com insegurança afetiva, busca de formas de poder, glória humana ou bem-estar económico” (EG 107).
CONCLUSÃO
Somos muitos catequistas, no Brasil estamos do Oiapoque ao Chuí, dos rincões amazônicos, com os ribeirinhos e as comunidades indígenas, aos prédios e casas nas grandes cidades. Estamos em nossa Diocese, com suas comunidades e paróquias. Somos jovens, adultos, velhos, mulheres e homens, pobres e ricos, letrados e analfabetos, contudo temos um só desejo: anunciar o Reino de Deus a todos, testemunhar que o amor é mais forte que o ódio, que a vida vence a morte. Que esta mensagem é para todos, de todos os lugares e culturas. Por causa do Reino nós deixamos nossas casas, nossas famílias, nosso conforto; por causa do Reino nós estudamos, nos preparamos e rezamos em comunidade; por causa do Reino suportamos chuva, frio e sol, humilhações e perseguições. Por causa do Reino nós encontramos alegria em meio as tristezas, força diante do medo, luz nas trevas. Tudo por causa do Reino prometido por Jesus. Não esmorecemos, nem desistimos. Porque sabemos que Deus está conosco, caminha conosco, nos encoraja e anima. Com Ele somos corajosos, capazes de vencer todo individualismo e tentações.
“Os desafios existem para ser superados. Sejamos realistas, mas sem perder a alegria, a audácia e a dedicação cheia de esperança. Não deixemos que nos roubem a força missionária!“ (EG 109).
+ Dom Vilson Dias de Oliveira, DC
Bispo Diocesano de Limeira
Fonte: http://diocesedelimeira.org.br/crise-do-compromisso-comunitario-e-as-tentacoes-que-os-catequistas-precisam-evitar/
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